A ioga ou o yôga?

Hoje é o Dia Internacional da Ioga – ou do Yôga, como querem os mais pedantes. Essa palavra veio do sânscrito, língua sagrada do hinduísmo e significa “união, junção”. O que ocorre é que ela foi há muito aportuguesada, assim como futebol, abajur, contêiner, uísque, etc., de modo que sua grafia é com i e sua pronúncia com o aberto. Além disso, em nossa língua ela é do gênero feminino.

No entanto, de algum tempo para cá os professores de ioga passaram a referir-se a essa técnica milenar como “o yoga”, com y, o fechado e no masculino. Alguns até chegam a corrigir a pronúncia dos alunos que dizem corretamente “a ióga”. Mas afinal, qual é o certo, o que dizem os dicionários ou o que dizem os iogues? É óbvio que corretos estão o dicionário e a gramática; essa onda de pronunciar “o yôga” é pura mania de prestigiar o que é estrangeiro em detrimento do vernáculo. Chamar a ioga de “o yôga” é como chamar o futebol de football. Você faria isso? Se não, não tenha medo de corrigir o seu professor de ioga, pois ele pode até entender muito dessa arte indiana, mas quem entende de língua portuguesa são os linguistas, os gramáticos, os dicionaristas e os professores de português.

13 comentários sobre “A ioga ou o yôga?

  1. Outro artigo muito oportuno! Parabéns por levantar essa lebre!
    Creio que um dos motivos para essa pronúncia com O fechado (ô) é que, em certos textos mais antigos, a palavra aparece grafada YÔGA, com o circunflexo a indicar que o O é longo nessa palavra sânscrita. Já vi o termo citado assim.
    Quanto à grafia com Y, creio que é por influência do inglês, of course! Muita gente tende a achar que as formas inglesas das palavras são a grafia “original”… 😉

  2. Isso me fez pensar em “shampoo”. Todas as vezes que precisava falar de fonética e ortografia, os alunos levavam susto e não acreditavam que a grafia, segundo o vernáculo, é “xampu”.

  3. O VOLP registra ioga como substantivo de dois gêneros. E outros dicionários registram a pronúncia de i(Ó/Ô)ga.

    “Lingua é uso”.

    “O dicionário é o cartório da língua”.

    Obs.: sou seu fã!

    Grande abraço,

  4. Caro Edilson, obrigado pelo comentário. De fato, a aceitação da palavra “ioga” como sendo de ambos os gêneros e com “o” igualmente aberto ou fechado é uma inovação bem recente e certamente está sendo abonada por influência dos iogues que eu chamo de pedantes. Língua é uso, mas também pode ser macaquice.

  5. O uso do y (yoga), apesar da correta grafia com i (ioga) acontece porque a transliteração tradicional do sânscrito para o alfabeto latino emprega o y com essa função semivocálica; quanto ao timbre do o, o correto, seguindo a pronúncia sânscrita da palavra, é o som fechado de ô, e não a vogal aberta ó, que não ocorre na língua original.

    1. Certo, Roger, mas, se “yoga” é palavra sânscrita, “ioga” é palavra legitimamente portuguesa. Quando uma língua importa um vocábulo e o nacionaliza (no nosso caso, quando aportuguesamos a palavra), a pronúncia original pouco importa. Se não, deveríamos pronunciar “fútbol” em vez de “futebol”. O fato é que a palavra “ioga” está no português desde o século XIX e se grafa com “i” desde 1943. Esse tempo todo, sempre foi pronunciada com “o” aberto. Esse modismo de grafar “yoga” e pronunciar o “o” fechado é coisa bem recente (anos 80 para cá).

  6. Um outro exemplo é Buda, que sempre foi escrito assim, mas de uns tempos para cá o pessoal começou a escrever Buddha. Mas, ao contrário do Ioga vs. Yoga, em que é fácil pronunciar com ô fechado, duvido que consigam pronunciar direito o dh sem deixar ver que é forçado, visto que esse fonema não existe em Português.

    1. Alguns teimam em escrever Buddha, estendendo o trígrafo para os derivados “buddhismo”, “buddhista”, que obviamente estão em desacordo com a nossa ortografia. Dá pra escrever naturalmente darma (dharma) e sanga (saṅgha), mas quem sabe se esse desleixo pelo apropriado aportuguesamento de palavras de outras línguas, estrangeiras ou não, não se deve ao tal complexo de vira-lata de que muitos brasileiros sofrem por aqui…

      A questão da escrita yoga /iôga/ me parece dever-se à atenção exigida à correção ao recitar e fazer os devidos usos e leituras dos termos, neste caso sânscritos, em ambiente religioso, pois a precisão de pronúncia é muito enfatizada nas tradições indianas. Quanto ao gênero, gostaria de lembrar que essas palavras terminadas em a breve, na língua sânscrita, são masculinas, daí ‘o’ Buda, ‘o’ Darma, ‘o’ Sanga; nos dicionários encontramos rajaputro, sendo que o nome original é rajaputra, ou seja, “o filho do rajá”, porque putra (masc.) = filho, e poderia permanecer com o a final, e continuar usando o artigo masculino, tal como usamos em paalvras de origem grega que acabam em a; putrī (fem.) = filha, deva (masc.) = deus/divindade/deidade, devī (fem.) = deusa. Inclusive, em relação aos dois últimos substantivos, deva & devī, a pronúncia do e também é fechada: dêvâ & dêví.

      Concordo plenamente com o mestre Aldo que a palavra ioga está sujeita às diretrizes gramaticais brasileiras (ou do português brasileiro), rimando, portanto, com toga, soga, roga, sinagoga, joga… só comentei pra dizer que o pedantismo possivelmente se deve à imersão dos que assim falam num ambiente em que pouco se importam com as regras do nosso vernáculo, o que é uma pena, pois assim dificultam o processo de aculturação e integração.

      Abraços gelados de Santa Maria, Rio Grande do Sul!

  7. Concordo que o y está inadequado, só o citei por causa do sistema de transliteração e, em relação à escrita yoga, a causa deve ser mui provavelmente a influência da língua inglesa por todos os lados, ainda mais que a maioria (se não a totalidade) dos iogues vem de classes econômicas bem abastadas e fortemente influenciadas (e influenciáveis) pela cultura norte-americana/estadunidense – aí, sim, a pronúncia pode ser pedante por se tratar duma importação e imitação irrefletida (e, ainda neste caso do y, muitos escrevem Nova York, em vez de Nova Iorque, não é… outros teimam em yoruba/yorubá em lugar de iorubá) Kuwait em vez de Quaite?, Kiribati em vez de Quiribáti? Parece que os lexicógrafos não dão atenção rigorosa para as pronúncias originais e para as possíveis em nosso vernáculo e não cobrem grande extensão de terminologia, gentílicos, glossários religiosos, unidades monetárias… eu mesmo não pratico ioga, mas tenho alguma familiaridade com línguas do subcontinente indiano por causas religiosas, além dum longo interesse amador em questões linguísticas já em português; na leitura do sânscrito não se ouvirá um ó ao lermos योगाचार [iôgátxárâ], por exemplo, e a maioria não vai se importar em escrever yoga ou yôga, porque pouco se importam com a língua portuguesa (infelizmente) e suas diretrizes. Por que Seychelles e não Seicheles? Osaka ou Ossaca? O mundo escreve Singapura, mas em português tinha de ser com c até pouco tempo: Cingapura, sendo que ‘singa’ vem do sânscrito siṃha, tal qual em cingalês, que deveria ser singalês. Quando os portugueses começaram a redigir gramáticas e a escrever nas línguas indígenas sul-americanas, simplesmente passaram as incongruências do uso de c, s, ç, qu para essas línguas, quando seria mais lógico usar k, s. Palavras com h cuja pronúncia é fricativa (ou aspirada) nas línguas originais, mas as gramáticas portuguesas dizem que a letra é muda, dificultando ainda mais os aportuguesamentos, como Yokohama (Iocorrama? Iocoama?) e as pessoas falam “rranseníase”, escrevem kilo, sushi, Bahamas, sem contar a confusão que fazem ao dar um nome para os filhos no Brasil, com várias letras inúteis em grafias caricatas e delirantes por aí… Correção e cuidado nunca foram prioridades em relação à língua portuguesa e à boa educação em nosso país; estudei sempre em escolas públicas (numa durante o fundamental e noutra durante o médio) e entendo que há muitas dificuldades e contratempos para os docentes para que se incomodem com desvios de pronúncia e grafia da massa popular que tem bem outras preocupações, mais prementes para um povo em grande parte subdesenvolvido em todos os aspectos; mas os dicionários, as gramáticas e o VOLP ainda parecem muito atrasados em diversas áreas – eu diria singelamente que uma das maiores dificuldades é a fonética e fonológica, pois em português não temos análises e aprofundamentos que são facilmente encontráveis em inglês (pra variar). Parabenizo o senhor, professor Aldo, cujo trabalho também acompanho em seu canal no YouTube; apesar do prazer que tenho nestes assuntos, não teria coragem de enfrentar cursos universitários, e realmente felicito o senhor, caro mestre, pela sua divulgação e, agora, por sua atenção ao ler estas mal traçadas linhas… Se o senhor considerar adequado, pode não publicar este meu segundo comentário. Muito grato!

    1. Concordo com as suas considerações, Roger, e agradeço por me seguir. O único reparo que eu faria (e é apenas a minha opinião pessoal) é que “Nova York” não deixa de fazer sentido, já que é uma referência à cidade inglesa de York, que ninguém grafa como “Iorque”.

  8. Interessante sua opnião, que tem que aportuguesar a palavra ioga em português, mais tem um detalhe o sãnscrito é igual o latim, é um conjunto de sons sagrados justamente por serem antigos assim pronunciados, lembra que os padres só faziam missa em latim, agora fazem em português, porém algumas palavras continuaram em latim como amém e muitas outras, por ser um mantra tem poder por ser antigo e na mesma pronúncia de séculos, mais falar ioga também não está errado só em português.

  9. Dois mestres em disputa: deu empate! Parabéns, visto que só obtivemos benefícios! Acompanho o relator…, ou seria o contendor?… 🤔

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