A cítara e a guitarra

Outro dia, um amigo meu que é roqueiro e toca guitarra elétrica me perguntou a origem da palavra guitarra. Como acho que essa pode ser também a curiosidade de outras pessoas, resolvi responder à sua pergunta neste espaço.

A palavra portuguesa guitarra, que aqui no Brasil empregamos como sinônimo de guitarra elétrica (ou violão elétrico, como se dizia antigamente), significa originalmente apenas “violão”. Esse é o sentido da palavra no português lusitano e também em outras línguas (francês guitare, inglês guitar, italiano chitarra, etc.). O inglês, por exemplo, faz distinção entre electric guitar (a nossa guitarra) e acoustic guitar (o nosso violão).

Aliás, em Portugal o termo guitarra também é empregado para designar um tipo particular de instrumento de cordas característico da música portuguesa – quem já escutou algum fado na vida com certeza ouviu o som da guitarra portuguesa.

Essa palavra nos chegou do espanhol guitarra, igualmente significando “violão” – aliás, a Espanha é o berço do violão moderno, este que conhecemos e que substituiu o alaúde como instrumento de música popular. Mas o espanhol tomou essa palavra do árabe kītâra ainda nos tempos da dominação islâmica na península Ibérica. E agora o mais incrível: o árabe kītâra é empréstimo do grego kithára, que quer dizer… “cítara”. Isso mesmo, a guitarra, elétrica ou não, é neta do alaúde e bisneta da cítara grega, aquele instrumento musical semelhante a uma lira (que, por sua vez, é semelhante a uma pequena harpa).

Um dado interessante: o italiano chitarra proveio diretamente do árabe, ao passo que, nas demais línguas, a origem é o espanhol. É que, na Idade Média, os italianos, em especial os venezianos, comerciavam diretamente com o Oriente, de onde trouxeram a palavra e também o instrumento.

5 comentários sobre “A cítara e a guitarra

  1. Bacana.
    Já eu fiz Piano Clássico como faculdade, um instrumento que no século XVIII era chamado pianoforte e, nos primórdios mesmo, “clavicembalo con piano et forte”, que quer dizer “teclado com fraco e forte”. É que antes dele, só havia instrumentos de teclado que não possibilitavam tocar sons com muita diferença de volume (baixo e alto). Depois o nome foi abreviado para piano, uma palavra que, pelo que entendo, tem a mesma raiz do nosso “plano”, pois as palavras que em Português têm uma consoante seguida de l e vogal, o Italiano troca o l por um i como semivogal.

    1. Perfeito, Cleverson. Em italiano, o piano ainda se chama “pianoforte”. E, de fato, a palavra italiana ‘piano’ é da mesma origem das palavras portuguesas ‘plano’, ‘chão’ e ‘porão’. Só que cada uma delas nos chegou por um caminho diferente.

  2. Caro Aldo,

    Quando, em PB, dizemos algo como “Aldo, estragou o computador”, qual é o sujeito?

    Pensei inicialmente que se pudesse tratar de uma oração invertida, caso em que o sujeito seria “o meu computador”, e a ordem direta, “o meu computador estragou”, em lugar de “o meu computador estragou-se”, com omissão do pronome reflexivo que é comum no PB e também não é raro no PE.

    Mas não me pareceu que seja isto que pelo menos eu quero dizer. Pensei então que seria um caso de sujeito indeterminado, tambem com omissão do se, que, todavia, atuaria, neste caso, como índice de indeterminação do sujeito. É uma hipótese que me parece mais consoante com o uso que eu sinto fazer.

    Em PE, salvo engano, esta frase seria interpretada como se o sujeito oculto fosse “você”, como se a pessoa que fala falasse com o Aldo e o acusasse de ter estragado o seu (da pessoa que fala) computador.

    Existe algum estudo sobre construções como esta, que eu acho que são bem comuns?

    A propósito, acho que pluralizar a frase ajudaria a entender a que tipo de construção me refiro. Seria:

    – Aldo, estragou os computadores.

    Assim, sem concordância mesmo.

    1. Concordo plenamente com você. Em PE, o sujeito oculto seria de fato “você”. Em PB, penso que o sujeito é “o computador”, que ou se estragou sozinho (então o “se” oculto indicaria verbo pronominal – a chamada voz média dos gregos) ou foi estragado por alguém (e então o “se” oculto seria índice de voz passiva sintética).

    2. Prezado Aldo,

      Não me lembrei dos verbos pronominais! Eu diria que, no “meu” PB (rs), o verbo, no exemplo dado, é pronominal. É uma hipótese bem melhor que a do índice de indeterminação do sujeito, a que só recorri porque quis excluir a hipótese, que não me parecia partinente, de se tratar de partícula apassivadora (e não “pronome reflexivo”, como escrevi por erro mesmo, porque eu tinha mesmo em mente uma frase passiva) e porque não me lembrei dos verbos pronominais.

      Um abraço,
      Rodrigo.

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