A música popular brasileira atual tem sido marcada por um fenômeno incomum em outras épocas, bem como em outros países: a modificação dos sobrenomes dos artistas. Às vezes, o erro pode ser do próprio tabelião, e por isso um sobrenome italiano como Calcagnotto se torna Calcanhoto. Mas o mais frequente é que os próprios artistas simplifiquem seus nomes para facilitar a venda de discos, num claro reconhecimento de que o público tem dificuldade de soletrar nomes estrangeiros. Aí Vercillo vira Vercilo, Cañas vira Canhas, e assim por diante.
Curiosamente, isso ocorre com artistas, digamos, mais elitizados. Os mais populares têm feito o movimento inverso, duplicando consoantes para dar um ar sofisticado a nomes absolutamente comuns. E assim temos Gusttavo, Leitte, e uma série de grafias pouco ortodoxas, para não dizer estranhas mesmo.
Isso também acontece com atores de televisão. De um tempo para cá, tornaram-se frequentes as Alinnes, Paollas, etc. Há até uma atriz cujo sobrenome passou do prosaico Oliveira para Ólive, Óllive e finalmente Óliive (!). O motivo alegado em geral é a numerologia: tais grafias supostamente favorecem o sucesso. Crendices à parte, o êxito ou fracasso ligado à grafia do nome se deve mais ao gosto do público. Aparentemente, pessoas menos escolarizadas preferem nomes com grafias estrambóticas, cheios de k’s, w’s e y’s. Ao contrário, as de maior instrução optam pela simplicidade. Talvez por isso, a cantora Cláudia, cujo trabalho sempre teve por foco a MPB de boa qualidade, tenha caído em certo ostracismo, apesar do inequívoco talento, depois que, por razões numerológicas, passou a assinar-se Cláudya.
Engraçado ficarem preocupados com a grafia do nome e a numerologia, quando deveriam se preocupar com a qualidade da música, no caso dos cantores, cuja qualidade desapareceu…
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E isso aí!
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O texto contém o que anuncio: a falta de escolaridade é o problema.
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Lá fora alguns fazem o mesmo, como o John Bongiovi que mudou para Jon Bon Jovi…
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Prezado Aldo,
Aportuguesamentos de sobrenomes estrangeiros sempre foram comuns. Há até topônimo em homenagem a bandeirante de ascendência alemã que testemunha essa tendência: Betim.
O sobrenome da minha mulher, de origem alemã, recebeu, na Silésia, um sufixo polonês (-ek) e perdeu, no Brasil, um ch (dá sequência sch original).
Como já disse algumas vezes, não sou linguista nem etimologista, mas sou genealogista há uns 20 anos e vi inúmeras mudanças de sobrenomes desde os primeiros tempos do Brasil colonial: além de Betting > Betim, vem-me à memória Barwell > Baruel, para ficar em dois exemplos da Genealogia Paulistana, obra em razão da qual se chamavam quatrocentões aos paulistas contemporâneos à publicação cujos antepassados foram por ela catalogados.
Mais “recentemente”, o patriarca gaúcho dos Collores (que a maioria manteria no singular, por desconhecer que se pluralizam os sobrenomes em português; e que alguns pluralizariam Collors, como fizeram com gols) aportuguesou o Koehler do padrasto alemão.
Outros dois exemplos, até mais aristocráticos, são Lancaster > Lencastre > Alencastro e Orléans > Orleães.
Em Portugal, que tem um dos índices mais altos de proficiência em inglês na Europa, a tendência é aportuguesar tudo quanto se pode, à semelhança do que ainda hoje fazem aos nomes de monarcas estrangeiros, como Isabel II da Inglaterra ou João Carlos da Espanha.
Não me parece que aportuguesamentos se creditem exclusivamente à ignorância e falta de proficiência em línguas estrangeiras dos brasileiros.
Um abraço,
Rodrigo.
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Caro Rodrigo, o fenômeno mais geral da nacionalização – que no caso do português se chama aportuguesamento – de nomes estrangeiros ocorre em todas as línguas, mas geralmente por erro dos tabeliães, especialmente os antigos, que eram pouco letrados. Foi assim que Steinweg se tornou Steinway nos EUA, Beckmann virou Bequimão no Brasil colonial, etc. (Aliás, desde algum tempo as cidades de Brodósqui – SP e Joinvile – SC voltaram a se chamar Brodowski e Joinville – isso sem falar em Paraty, Campos dos Goytacazes e a famosa Bahia.) No entanto, há dois outros aspectos que, até onde eu sei, são típicos da nossa língua.
Em primeiro lugar, a atualização de nomes históricos (e aí Luiz de Camões vira Luís de Camões, Gregorio de Mattos vira Gregório de Matos, Eça de Queiroz passa a Eça de Queirós, Ruy Barbosa a Rui Barbosa, e assim por diante). Nada semelhante aconteceu com Shakespeare, Marlowe, Veléry ou Montaigne, que nunca serão – espero – Shakespear, Marlow, Valéri ou Montagne. Aliás, eu espero que daqui a cem anos meu sobrenome não se transforme em Bizóqui!
Em seguindo lugar, e é disso que trato no artigo, há o aportuguesamento de nomes de celebridades por razões mercadológicas: a grafia mais simples vende mais. Não percebo esse mesmo movimento entre artistas de língua francesa ou inglesa, que têm grafias bem mais complexas que as nossas.
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Algumas vezes, o motivo de colocarem letras duplicadas é simplesmente porque o nome do artista é comum e fica mais difícil de ser localizado no Youtube ou nas redes sociais. Hoje, estar nas redes e ter engajamento são elementos de divulgação e de sucesso.
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