Desde o início do governo Bolsonaro, vem-se tornando cada vez mais frequente no discurso político e também no jornalismo o uso da palavra narrativa com um novo significado: o de versão falsa de um fato político com o objetivo de encobrir a responsabilidade de seus protagonistas. Ou seja, diante de eventos de impacto, como a interferência do Presidente na Polícia Federal, a não resposta do Ministério da Saúde aos e-mails da Pfizer ou a possível intenção de compra superfaturada da Covaxin, governo e oposição apresentam diferentes narrativas, isto é, uma distinta cronologia dos fatos, bem como uma diversa justificativa para eles.
A prática da camuflagem do incômodo político por meio de versões fantasiosas não é nova; na verdade, é velha como o mundo: os gregos desenvolveram uma técnica chamada retórica justamente para fazer prevalecerem os interesses e pontos de vista do orador sobre os do oponente por meio do discurso. Mais do que a arte do convencimento, a retórica tem sempre sido usada como a arte da ocultação da verdade.
E, diante da guerra de narrativas, turbinada nos dias atuais pela manipulação de dados estatísticos, documentos e declarações de autoridades, inclusive com o uso da alta tecnologia, a opinião pública fica confusa, sem saber em quem acreditar, afinal, como demonstra Akira Kurosawa em seu famoso filme de 1950 Rashomon, a verdade não existe, o que existe são versões. Ou, se preferirem, narrativas.
Teeteto versus Protágoras
A sofisma; retórica; relativismo etc., são atributos da política.
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