A Páscoa passou, e nessa data os cristãos rememoram a traição de Judas, a prisão de Jesus, seu julgamento e execução na cruz, além de sua suposta ressurreição. Uma das informações sempre veiculadas na narrativa sobre os últimos dias do Cristo é que ele foi traído pela quantia de 30 dinheiros, o que causa certa estranheza a algumas pessoas, visto que dinheiro não é unidade monetária, mas a própria moeda. Se perguntássemos qual era o dinheiro em circulação na Roma antiga e alguém respondesse “dinheiro”, acharíamos que a pessoa não entendeu a pergunta ou está de gozação, mas é isso mesmo: o dinheiro em circulação em Roma era o dinheiro — ou melhor, o denário.
Na verdade, a unidade monetária romana era o asse (em latim as, genitivo assis). Por sinal, é daí que vem o nosso ás do baralho. Esse sistema monetário tinha base duodecimal, e cada parte ou fração se chamava uncia, origem da nossa onça (não o felino selvagem, bem entendido, mas a unidade de medida ainda utilizada nos países anglo-saxônicos). Uncia deriva de unus, “um” em latim.
Mas e o denário? Em Roma, denarius (subentendido numus, “dinheiro, numerário”) era uma moeda de dez asses. É que denarius provém de decem, “dez” em latim. Portanto, Judas Iscariotes delatou Jesus Cristo por 30 denários ou 300 asses. Só não me perguntem se essa quantia era muito ou pouco dinheiro; não faço a menor ideia do poder de compra de um asse romano, e acho que nenhum economista seria capaz de fazer a conversão desse valor para o nosso real brasileiro atual.
De todo modo, os apóstolos eram pobres, e certamente uma soma como 30 dinheiros, mesmo que valesse apenas uns 300 reais, já era muito, especialmente para um apóstolo ambicioso e inescrupuloso, capaz de trair seu mestre por dinheiro.
Pelo menos, no final Judas se arrependeu de sua vileza e se suicidou de remorso.
Uma curiosidade é que a palavra denarius produziu uma unidade monetária, o dinar, muito usado em vários países, como Argélia, Iraque, Jordânia, Líbia, Tunísia e Sérvia. O nome dinar saiu do latim e passou pelo siríaco dinara, depois pelo árabe دينار (dinar), até chegar ao português. E denarius também resultou no espanhol dinero e no italiano denaro, além do antigo francês denier, hoje substituído por argent, literalmente “prata”.