Novas palavras a ser proibidas por serem politicamente incorretas

DISCLAIMER AOS DESAVISADOS: Este texto tem fortes doses de ironia.

Como vocês sabem, a língua portuguesa, como de resto todas as línguas, é machista, racista, classista, homofóbica, transfóbica, aporofóbica, etc. etc. Portanto, precisamos urgentemente banir do nosso vernáculo todas as palavras e expressões que firam a suscetibilidade e os direitos das minorias. Aqui vai minha humilde contribuição a essa justa causa, apontando algumas palavras que até agora passaram despercebidas, mas que contêm uma grande carga de preconceito e desrespeito.

Comecemos pela palavra virtude. Sim, amigos, amigas e amigues, essa palavrinha aparentemente tão inocente e mesmo nobre veio do latim virtus, derivada de vir, “homem, ser humano do sexo masculino”, logo significa “qualidade de quem é homem, aquela que só o homem tem”. Como podem ver, é uma palavra pra lá de machista, visto que considera que só os machos da espécie têm a qualidade da virtude. Pelos mesmos motivos, devemos banir também viril, virilidade, varonil e másculo, pois todos esses termos remetem ao sexo masculino de forma positiva e elogiosa, desmerecendo as mulheres. Aliás, também é urgente proscrevermos hombridade (do espanhol hombre, “homem”) e homenagem (alguém até já propôs mulheragem em seu lugar, mas eu fico me perguntando se aí também não teríamos sexismo, só que em sentido oposto).

E por falar em mulheres, a própria palavra mulher é discriminatória, pois provém do latim mulier, “mulher casada, esposa”, como se só as casadas fossem mulheres de verdade. E o que dizer de senhor então? Essa palavra nos chegou do latim senior, que quer dizer “mais velho”, logo é um termo altamente ageísta. E jamais devemos dizer que um erro é crasso, pois crassus em latim é “gordo”, e nós evidentemente não somos gordofóbicos, né?

Por fim, jamais use a palavra atroz, que vem de ater, “negro” em latim, pois você estará associando a ideia nefasta de atrocidade às pessoas afrodescendentes. E tampouco use a palavra alvo no sentido de meta a ser atingida, já que esse vocábulo significa “branco”, e assim você estará elevando a raça branca ao status de superioridade, perfeição, de objetivo a que todos devem aspirar.

Bem, acho que por hoje já dei minha contribuição para tornar nosso idioma mais inclusivo e menos discriminatório. Em todo caso, se encontrar mais termos preconceituosos, darei prosseguimento ao meu index verborum prohibitorum, ok?

Homossexualismo ou homossexualidade?

O caso da piada homofóbica feita pelo disseminador de fake news bolsonarista Otávio Fakhoury contra o senador Fabiano Contarato e a elegantíssima resposta dada por este ao negacionista Fakhoury na sessão da CPI da pandemia repercutiu durante toda a semana. Emocionado, indignado, mas altivo, o senador falou em nome de todos aqueles que são diariamente desrespeitados neste país por sua orientação sexual, cor da pele, gênero, idade, condição física, origem étnica ou geográfica, e assim por diante.

É claro que eu jamais faria uma brincadeira tão sem graça e tão desrespeitosa, mas se a tivesse feito, naquele momento na CPI, diante das câmeras e de milhões de telespectadores brasileiros, teria cavado um buraco no chão e me enterrado nele. Para resumir numa palavra a atitude do militante bolsonarista, eu diria que, além de insultuosa, foi uma tremenda babaquice, coisa de moleque e não de homem feito. Ainda mais vindo de alguém que detém certa cultura, muitos recursos materiais e que exalta a família o tempo todo, mas só um tipo de família – a dele.

Mas o caso suscitou novamente uma controvérsia linguística. Qual a forma politicamente mais correta: homossexualismo ou homossexualidade? Esse debate não é novo, e muitos dizem que cabe aos membros da própria comunidade LGBTQIA+ decidir como devemos nos referir a eles. Não vou entrar nessa polêmica, que envolve lugar de fala e outras questões atinentes à linguagem inclusiva. Vou apenas expressar minha opinião com base no meu conhecimento de língua.

Critica-se a forma homossexualismo alegando que o sufixo ‑ismo remete à ideia de doença ou patologia. Teríamos então nanismo, autismo, sedentarismo, etc., ao passo que o sufixo ‑dade de homossexualidade seria mais neutro, denotando condição – uns chamam até de opção (o que não é o caso, já que ninguém escolhe ser homossexual) ou orientação.

Entretanto, há inúmeras contraprovas desse argumento. Em primeiro lugar, o sufixo -ismo aparece em capitalismo, marxismo, classicismo, romantismo, automobilismo, alpinismo, cristianismo, budismo, e muitos outros.

Em segundo lugar, o sufixo ‑dade ocorre no nome de várias patologias: ansiedade, obesidade, hiperatividade.

Portanto, penso que não há nada de negativo em homossexualismo e nada de neutro ou positivo em homossexualidade. Ainda que os portadores dessa condição tenham sua preferência vocabular – e eles estão no seu direito –, não vejo sentido em repreender alguém por usar outro termo que tem exatamente o mesmo significado. Ou seja, sufixos não são bandeiras ideológicas, são meras ferramentas da língua para expressar conceitos. Há muitos indivíduos homofóbicos usando a palavra homossexualidade, assim como há muitos simpatizantes da causa LGBTQIA+ empregando homossexualismo, tudo por uma questão de hábito, sem qualquer outra conotação.

E em tempo: parabéns ao senador Contarato por sua coragem e postura cívica e a todos aqueles que, como ele, se sentiram ofendidos por um babaca.