Uma palavra esquisita

A pedido do meu leitor Cleverson Casarin Uliana, vou falar hoje de uma palavra esquisita: justamente a palavra esquisito. E por que ela é esquisita? Porque existe em várias línguas europeias (espanhol exquisito, francês exquis, italiano squisito, inglês exquisite, alemão exquisit, sueco exkvisit) e em todas significa a mesma coisa: apurado, distinto, delicado, excelente, raro, sofisticado, elegante, requintado. Somente em português é que esquisito significa “esquisito, estranho, incomum”. Mas por que isso acontece?

Vamos começar voltando à origem do vocábulo, no caso, o latim exquisitus, particípio passado do verbo exquirere (= ex- + quaerere), que quer dizer “buscar com cuidado”, sentido que derivou para “buscar algo raro”. Logo exquisitus passou a significar “raro” e, portanto, “precioso, valioso”. Daí para assumir o sentido de “excelente, requintado” foi um pulinho. É esse significado que se mantém até hoje nas línguas supracitadas. E que também já pertenceu ao português (alguns dicionários ainda listam essa acepção, já que ela figura em textos mais antigos). De fato, não é incomum – e portanto não é esquisito – encontrar a palavra usada nesse sentido em textos dos séculos XVI e XVII. Por exemplo, Camões, n’Os Lusíadas, emprega “manjares novos e esquisitos” falando de comidas requintadas.

No entanto, a partir do século XVIII e sobretudo do XIX, esquisito passou a ser usado em tom pejorativo, como algo raro não por ser excelente, mas por ser estranho, anormal, inusual. Acontece que, aos olhos da plebe, os hábitos, as roupas, os gestos, as comidas e a linguagem da aristocracia parecia não propriamente sofisticada, senão muito distante do normal para um cidadão comum. Daí que o comportamento da nobreza aos olhos do povão parecesse mesmo esquisito. E foi essa a acepção da palavra que nos ficou até os dias de hoje. Esquisito, não?